CARLOS FERRO Um guarda do Estabelecimento Prisional de Lisboa (EPL)
está suspenso de funções e integra um quinteto de agentes a quem
foram instaurados processos disciplinares por agressão a soco,
pontapé e murro a um recluso, num corredor.
Com a denúncia da
situação, ocorrida a 11 de Novembro, a Direcção-geral dos Serviços
Prisionais (DGSP), ficou a saber que no EPL foram violadas diversas
normas internas, como o uso de uma «sala de espera», conhecida como
a «cela 80», para situações disciplinares. Aliás, o
inspector-coordenador responsável pelo primeiro inquérito a esta
denúncia, escreve ter ficado com a «impressão de que por vezes esta
"sala de espera" é usada como antecâmara de castigos corporais a
reclusos mal comportados».
Infracções que o advogado João
Coriel, defensor do preso, considera serem «crimes contra a
humanidade».
Segundo os familiares, que visitaram o detido a
12 de Novembro, este apresentava «o septo nasal com extenso trauma,
possivelmente fracturado, o olho direito com hematoma e derrame, o
tórax e as costas com diversos hematomas, possivelmente com contusão
ou fractura de costelas». Dados que fazem parte da exposição
apresentada ao director do EPL, documento onde se diz que o recluso
não «tinha tido qualquer assistência médica, apesar de a ter
reclamado insistentemente ao corpo de guarda prisional».
Os
factos denunciados foram investigados, num primeiro inquérito, pelos
Serviços de Auditoria e Inspecção da DGSP e nas conclusões, a que o
DN teve acesso, é proposto que sejam instaurados cinco processos
disciplinares, a decorrer: por desrespeito a regras e relações
hierárquicas, violação do dever de zelo, obediência e dever de
lealdade.
Além da suspensão preventiva de um guarda, que pode
ser expulso devido à «prática de actos manifestamente ofensivos das
instituições e princípios de integridade física e de dignidade da
pessoa humana, vilipendiados na pessoa do recluso».
O
inspector-coordenador propõe também que sejam pedidas ao responsável
do estabelecimento prisional «medidas concretas para que finde a
utilização da 'sala de espera' como local de aplicação de medida
especial de separação» e que os responsáveis do EPL devem fazer uma
«informação personalizada sobre o desempenho de cada um dos
instruendos neste caso, a transitar para o respectivo processo
individual para efeitos de futura avaliação do seu perfil e
aptidão».
PROCESSO. As sevícias, como retrata o autor
da inspecção, ao recluso surgiram na sequência de uma queixa de um
guarda instruendo que se terá sentido «despeitado ou desautorizado»
pelo preso quando este lhe disse que «pulava a secretária» para ir
buscar o saco de alimentos que o agente recusava
entregar-lhe.
Na auditoria é referido que os guardas
decidiram levar o detido para a «sala de espera» - local utilizado
«como cela de separação para acolhimento de reclusos que assumem
comportamento incorrecto» - de onde o retiraram pelas 19 horas,
quando todos os presos já estavam nas respectivas celas. De seguida
é levado por um corredor «onde um grupo não identificado de cerca de
10 a 15 guardas prisionais o aguarda, formando alas, para que o
recluso passe no meio deles». Segundo o relatório foi nessa altura
que «todos eles lhe batem».
Terá, então, valido a intervenção
de um outro elemento da segurança que ao aperceber-se da situação
«corre a tirar o recluso, que está baixo, de mãos na cabeça». Após
várias peripécias, é levado para a ala a que pertencia, onde o
fecharam sem informar as chefias, que não se terão apercebido da
«sova», nem pedido para ser examinado pelo médico.
O
instrutor realça a existência de uma «conjugação de silêncios em
redor deste caso», e escreve: «A seriedade, a autoridade e a
credibilização da Administração Penintenciária estão claramente em
causa neste processo.»
Queixas, processos e
acusações relatadas
1 - FAMÍLIA DE RECLUSO DENUNCIA
LESÕES
Mãe e companheira do preso denunciam que este
tinha o septo nasal com extenso trauma e o olho direito com
hematoma. Tal como lesões no tórax e costas.
2 - SUSPENSÃO
PREVENTIVA E VÁRIOS PROCESSOS
O inspector-coordenador
que investigou as queixas do preso propôs a instrução de processos
disciplinares a cinco guardas prisionais e a suspensão de
um.
3 - ACUSAÇÃO DE CRIMES CONTRA A HUMANIDADE
O advogado do recluso defende que a acção «disciplinar» dos
guardas pode ser enquadrada no «Crime contra a Humanidade» previsto
no Código Penal.